Você sabia que a bandeira grega chegou a tremular em Constantinopla ao final da Primeira Grande Guerra Mundial, e que a região da Trácia Oriental (a parte européia da atual Turquia), incluindo Constantinopla e a Catedral de Hagia Sofia, retornaria ao controle grego? Bem, isso não aconteceu porque o Reino Unido não cumpriu com o seu lado do acordo, temerosos com a reação dos muçulmanos súditos do Império Britânico. Ante disso, porém, em 1878, a esquadra britânica impediu os russo de reconquistar Istanbul (Constantinopla).
O texto abaixo é extraído do artigo Η Αγια Σοφιά χωρίς μιναρέδες και με χριστιανικό σταυρό στον τρούλο, σε ελληνικό χαρτονόμισμα του 1923 (A Hagia Sophia sem minaretes e com uma cruz cristã na cúpula, na nota grega de 1923).
No final da Primeira Guerra Mundial, em 30 de outubro de 1918, foi assinado o primeiro armistício da guerra, o Armistício de Mudros, entre o Almirante Inglês Calthorp, procurador dos Aliados da Tríplice Entente, por um lado, e o Império Otomano, por outro. A Grécia estava do lado dos vencedores.
Os encouraçados Georgios Averoff e Kilkis navegaram para Constantinopla e ali ergueram a bandeira grega como uma das forças vitoriosas da Grande Guerra, visando a realização da Grande Ideia. Esses eventos se tornam uma ocasião para expressões emocionais de entusiasmo por toda a população grega de Istambul, naquele tempo, ainda numerosa.
Uma revelação importante foi feita pelo jornal turco Zaman de que, após a ocupação de Istambul pelas tropas aliadas da Tríplice Entente, em 13 de novembro de 1918, os britânicos pretendiam devolver Hagia Sophia aos cristãos da cidade, mas no último momento eles se retiraram.
Percebe-se que se isso acontecesse e se a cruz dominasse novamente a majestosa cúpula de Hagia Sophia, este seria um evento de grande significado histórico, simbólico e psicológico e afetaria decisivamente o retorno final da cidade às mãos dos gregos.
O reaparecimento da cruz na cúpula de Hagia Sophia seria um dos maiores golpes históricos sobre os turcos e provocaria a evacuação da cidade do elemento islâmico, como estimavam as tropas aliadas na época, segundo o jornal turco.
E quando tudo parecia pronto e os planos para a reconversão de Hagia Sophia em uma igreja cristã já haviam sido feitos, houve uma reação das tropas muçulmanas do Império Britânico e foram feitas algumas ameaças de que, se isso acontecesse, os muçulmanos na Índia se revoltariam, o mesmo podendo ocorrer em outras áreas do Império Britânico, onde este dominava populações muçulmanas.
Segundo Zaman, os primeiros pensamentos do então primeiro-ministro britânico Lloyd George, após a ocupação de Constantinopla pelas tropas da Tríplice Entente, em novembro de 1918, foram a entrega imediata de Hagia Sophia aos cristãos. Com essa ação, como estimou o primeiro-ministro britânico, haveria uma grande tendência dos muçulmanos a fugirem para a Ásia Menor, pois parece que a cidade finalmente voltaria às mãos dos cristãos e retornaria ao seu nome original, ou seja, Constantinopla.
Quanto ao califado muçulmano que até então tinha sede em Istambul, eles seriam transferidos para Bursa ou Konya e, assim, grande parte do sacerdócio muçulmano deixaria a cidade. Por outro lado, de acordo com fontes britânicas da época, já havia centenas de mesquitas em Istambul, portanto, alterar o status de Hagia Sophia e convertê-la em uma igreja cristã não afetaria os deveres religiosos dos muçulmanos que permanecessem na cidade.
Mas, começou a haver discordância sobre quem a Hagia Sophia seria entregue. Obviamente, a primeira prioridade foi dada aos gregos da cidade, conforme relatado por fontes britânicas, pois Hagia Sophia foi o símbolo da ortodoxia grega por mil anos e agora o Patriarcado Ortodoxo Grego a reivindicava com seriedade. No entanto, existiam reivindicações do lado russo desde 1915, pelo historiador russo Trubetskoy com referências relevantes ao conhecido escritor russo Dostoyevski.
Mas nada disso aconteceu por causa de mudanças de planos vindos de Londres, o centro do então grande Império Britânico, que, naquela época, governava a maior parte do mundo islâmico e até ocupava as grandes cidades sagradas dos muçulmanos, ou seja, Meca e Medina.
A questão ficou sem resolução até a catástrofe da destruição da Ásia Menor e a ocupação de Istanbul pelas tropas de Mustafa Kemal Atatürk, em 6 de outubro de 1924. Assim, uma oportunidade única foi perdida para o cristianismo, mas também para o helenismo, que retornaria a este templo histórico após quatro séculos e meio de ocupação islâmica.
No entanto, Hagia Sophia não permaneceu como mesquita, pois Kemal Atatürk, segundo o jornal turco, aceitou os planos britânicos de transformá-la em museu. A lógica era que esse templo histórico se tornasse, como ele fez, uma atração mundial que a cada ano concederia à economia turca milhões de dólares em troca de visitantes vindos de todo o mundo para admirar esta obra-prima da ortodoxia grega. O Tratado de Lausanne (23 de julho de 1923) já havia imposto um regime greco-turco completamente diferente, tanto territorialmente quanto em termos de população.
Quanto à nota de quinhentas dracmas apresentando Hagia Sophia sem minaretes e com uma cruz cristã na cúpula, nunca foi emitida devido a inflação (de acordo com a justificativa oficial) e, portanto, possui um caráter honorário, permanecendo assim uma nota rara para colecionadores.
Aqui termina o artigo, e começa o meu comentário final, sobre a guerra russo-turca de 1877-1878.
O evento narrado acima não foi o único evento histórico no qual os britânicos ajudaram os turcos. Um evento famoso foi a Guerra da Criméia (1853-1856), quando o Reino Unido, aliado com a França e com os turcos-otomanos, lutaram contra a Rússia. Mas existe outro evento, não tão conhecido, durante a guerra russo-turca de 1877-1878, quando a esquadra inglesa veio em ajuda aos turcos para impedir que as tropas russas reconquistassem Constantinopla, e ocupassem os estreitos de Bósforos e Dardanelos. (Não existem princípios em geopolítica)
Só para servir de ilustração, este é o mapa da campanha da guerra russo-turca de 1877-1878. Veja que o exército russo já havia conquistado a Trácia Oriental (a parte européia da atual Turquia) e estava nos arredores de Istanbul (seta vermelha no canto inferior esquerdo do mapa). Mas, aí, os britânicos resolveram impedir a vitória final dos russos, salvando o Império Otomano.
“Em resposta à proximidade da Rússia com o estreito de Marmara, os britânicos, contra a vontade do sultão turco-otomano, intervieram na guerra. Uma grande força-tarefa representando a supremacia naval britânica entrou no estreito de Marmara e ancorou à vista do palácio real [em Istanbul] e do exército russo. Os britânicos salvaram o Império Otomano mais uma vez. Frenta à perspectiva de uma entrada britânica na guerra, os russos decidiram resolver a disputa através do Tratado de Santo Estéfano.”
Para vocês verem o quão perto os russos estavam de conquistar Istanbul em 1978, que turcos chegaram a se refugiar na então mesquita de Hagia Sofia, como ilustrado na figura abaixo.
Deixe um comentário