Um novo relatório contundente detalha a destruição do patrimônio cultural armênio por parte do Azerbaijão, incluindo a destruição de dezenas de milhares de esculturas de pedra, protegidas pela UNESCO. Muçulmanos destroem a história para poder afirmar “esta terra sempre foi nossa. Allahu Akbar!” A Turquia tem feito o mesmo.
Artigo escrito por Dale Berning Sawa, em 1/3/2019, no jornal londrino The Guardian, e complementado com dados e fotos do relatório da revista de arte Hyperallergic.
Pequena revisão histórica para contexto
Antes, porém, talvez seja oportuno uma pequena explicação sobre a origem do Azerbaijão e a situação geopolítica no Cáucaso. O Cáucaso é uma região compreendida entre o Mar Negro e o Mar Cáspio, composta atualmente pela Rússia, Geórgia, Turquia, Irã, Armênia e Azerbaijão.
Já sabemos que a Armênia é uma das nações mais antigas do mundo, e reinos armênios sempre existiram naquela região, variando de tamanho, chegando algumas vezes a alcançar o Mar Mediterrâneo. Em 301, a Armênia se tornou o primeiro país oficialmente cristão do mundo. A Armênia foi assolada pelas diversas ondas de invasões e massacres islâmicos turcos apartir do século XI. Mesmo assim, os cristãos se mantiveram como maioria aquela região, apesar do assentamento gradativo de povos turcomanos muçulmanos, particularmente no entorno do Mar Cáspio e na fronteira com a Pérsia. No começo do século XX, a União Soviética conquistou o Cáucaso, incluindo a recém criada República do Azerbaijão, que possuia um grande contingente de cristãos armênios, notadamente na região do Alto Carabaque (Nagorno-Karabakh). Em 1988, um plebiscito decidiu pela unificação desta região com a Armênia, o que desencadeou na Guerra de Nagorno-Karabakh, pois o Azerbaijão nunca aceitou esta unificação. A trégua de 1994 não encerrou o conflito, que continua como guerra de baixa intensidade até os dias de hoje.
Numa tentativa de apagar os séculos de história armênia da região, o Azerbaijão (a exemplo da Turquia) vem destruindo tudo o que seja armênio, sejam igrejas, pedras de túmulos e cruzes arménias de pedra (khachkar). Ou seja, a exemplo da Turquia, o Azerbaijão tenta apagar a história, alegando que os armênios nunca viveram naquelas terras.
Leia depois sobre o Genocídio Armênio.
O genocídio cultural cometido pelo Azerbaijão
A mais extensa campanha de limpeza cultural do século XXI não ocorre na Síria, como se poderia supor, mas numa parte largamente ignorada do planalto da Transcaucásia.
De acordo com um longo relatório publicado na revista de arte Hyperallergic em fevereiro, o governo do Azerbaijão tem, nos últimos 30 anos, promovido a eliminação sistemática da histórica herança armênia do país. Essa destruição oficial, ainda que oculta, de artefatos culturais e religiosos excede a destruição de Palmira pelo estado islâmico, segundo os autores do relatório, Simon Maghakyan e Sarah Pickman.
Maghakyan, analista, ativista e conferencista em ciência política, com sede em Denver, EUA, rotula como “o maior genocídio cultural do século 21”. Ele cresceu com as histórias de seu pai visitando um lugar bonito e misterioso chamado Djulfa. Localizado no enclave de Naquichevão (sob a custódia do Azerbaijão), nas margens do rio Araxes, era o local de uma necrópole medieval, o maior cemitério armênio antigo do mundo. Os visitantes através dos séculos, de Alexandre de Rhodes a William Ouseley, notaram o esplendor deste local remoto.
No seu auge, o cemitério continha em torno de 10.000 khachkars, ou pedras cruzadas, em posição ereta, o khachkar mais antigo datado do século VI. Exclusivas das tradições funerárias armênias, estas distintas e altas pedras vermelhas e amarelas róseo apresentam cruzes, cenas e símbolos figurativos e padrões de relevo altamente decorativos. Quando os soviéticos formalizaram as regiões autónomas de Nagorno-Karabakh e Naquichevão, em 1920, após décadas de pilhagem, restavam menos de 3.000 khachkars. O subsequente vandalismo episódico levou a Unesco, em 2000, a ordenar que os monumentos fossem preservados.
Mas isso teve pouco efeito. Em 15 de dezembro de 2005, o prelado da igreja armênia do norte do Irã, Bispo Nshan Topouzian, filmou – do outro lado do rio, no Irã – as forças armadas do Azerbaijão metodicamente devastando com marretas tudo o que restava de Djulfa. Os soldados carregaram os destroços para os caminhões e jogaram no rio Araxes.
As imagens podem ser encontradas em um filme de 2006 intitulado The New Tears of Araxes postado no YouTube, editado por Maghakyan e roteirizado por Pickman. Imagens de satélite mostram que, em 2003, a paisagem irregular e texturizada estava repleta de múltiplas estruturas pequenas. Em 2009, estava achatada e vazia.
O governo do Azerbaijão recusou repetidamente a entrada de inspetores internacionais no sítio, não responde a pedidos de comentários – inclusive para este artigo – e nega que os armênios tivessem vivido em Naquichevão. Tal obstáculo dificulta a verificação independente, mas a enorme quantidade de evidências forenses que Maghakyan e Pickman apresentam faz deste um caso sólido, difícil de ser contextado. Eles alegam que os eventos dramáticos em Djulfa marcaram o estágio final de uma campanha mais ampla para desnudar Naquichevão de seu passado nativo, cristão e armênio.
Muito pouca atenção internacional foi dada a esta história. A maior parte do material em que este relatório se baseia não foi reunida por órgãos oficiais, mas por indivíduos que, como Maghakyan e Pickman, operaram com seu próprio dinheiro.
O pesquisador local Argam Ayvazyan, agora exilado na Armênia, fotografou 89 igrejas armênias, 5.840 khachkars e 22.000 lápides entre 1964 e 1987 – que, segundo o relatório, desapareceram. Um escocês chamado Steve Sim viajou pelo leste da Turquia em 1984 e coletou mais de 80.000 slides e fotografias nos últimos 35 anos, documentando a antiga herança armênia em toda a região: “Era o lugar mais distante da Grã-Bretanha na época, e também o mais barato para visitar”, diz ele. Ele vem retornando regularmente desde então, acumulando uma biblioteca de 1.000 livros – com muitos livros de Ayvazyan – principalmente sobre a arquitetura armênia.
O antigo diretor do tesouro nacional do Azerbaijão, Akram Aylisli , por sua vez, vive sob prisão domiciliar virtual desde 2013, quando publicou textos críticos sobre as ações de seu governo. Ele primeiro protestou contra o que chamou de “vandalismo maligno” em um telegrama de 1997 ao presidente do país. “Essa ação sem sentido”, escreveu ele, “será percebida pela comunidade mundial como uma manifestação de desrespeito pelos valores religiosos e morais”.
Steven Sim indica que o relatório hiperalérgico não explica adequadamente o valor artístico do que foi perdido. A arquitetura armênia é única, diz ele – aparentemente minimalista na aparência, mas altamente sofisticada estruturalmente e construída para suportar a volatilidade sísmica da paisagem. Ele descreve as igrejas diminutas mais como escultura do que construção, com estruturas do topo das cúpula compreendendo um volume único, que parecem terem sido moldadas em pedra. Os khachkars, por sua vez, são regionais, o significado da iconografia e do simbolismo que eles mostram em grande parte perdidos no tempo. Essa perda é mais intensamente sentida com a destruição das pedras da cruz de Djulfa, que exibiam cenas da vida medieval diária – pessoas andando a cavalo, carregando jarros de água ou fazendo piqueniques em jardins. a comida disposta em tapetes – e estranhas criaturas míticas, incluindo uma fera de quatro patas com dois corpos, uma única cabeça e asas. “Eu olhei para milhares de khachkars em toda a Armênia”, diz Sim, “e eu só vi um que tenha esse animal de cabeça única de corpo duplo. Mas todos eles os tinham em Djulfa.”
O mundo legitimamente reconheceu a destruição de Palmyra pelo Estado Islâmico como um crime de guerra, uma imensa perda para o povo sírio e para a humanidade como um todo. Maghakyan espera que tanto os armênios quanto os azerbaijaneses vejam o que aconteceu em Naquichevão como um crime contra todos, cometido por um regime implacável. O historiador do Azerbaijão que agiu como revisor do artigo, mas desejava permanecer no anonimato por temer por sua segurança, disse a Maghakyan que o relatório era “para todos nós, independentemente de etnia e religião”, mas especialmente para os azeris que não perderam ou renderam sua consciência.
– descrição do genocídio , (texto e vídeo)
– bacia do Eufrates preenchida com os ossos dos armênios
– extermínio dos gregos de Constantinopla (1955)
– destruição das igrejas armênias pela Turquia (apagando a história)
– o esquecido genocídio armênio de 1019 AD
– reflexão (no ano do centenário)
maria angelina diz
Não conhecia este blogger. Gostei muito.Adicionei aos meus favoritos.Nada tenho contra qualquer etnia.Mas o RESPEITO é necessário.Lamenetável e assustador.
maria angelina diz
Não conhecia seu blogger. Gostei muito,acrescentarei aos meu favoritos.Nada tenho contra nenhuma etnia,mas considero que deve haver respeito e não destruição.Fatos lamentáveis e assustadores,esta destruição da história.Que Deus tenha piedade de nós.