Na sua porção leste, o Império Romano fez fronteira com dois impérios persas, a Pártia (247 a.C. a 224 d.C.) e a Sassânia (224 até 651). Diversas guerras foram travadas entre eles. No ano 395 d.C., o império romano se dividiu, e o Império Romano do Oriente (Bizâncio) passou a ter o ônus destas guerras. No total, foram mais de 30 guerras, sendo a primeira no ano 92 a.C. e a última, a mais sangrenta e devastadora de todas, durou 26 anos (de 602 a 628 d.C.).
A última guerra debilitou os dois impérios de tal modo que eles puderam oferecer uma resistência muito fraca contra a jihad islâmica, quando ela saiu da Península Arábica no ano de 632, para propagar pela espada a fé de Maomé. É deste conflito que tratamos neste artigo.
Em 602, se aproveitando de uma guerra civil dentro do Império Bizantino, o imperador sassânida Cosroes II invadiu a Armênia, o Levante, o Egito, e a Anatólia, chegando até mesmo às muralhas de Constantinopla.
Um dos eventos mais dramáticos desta fase ocorreu em maio do ano 614 (1405 anos atrás), quando Jerusalém foi conquistada pelos persas sassânidas, e a população cristã foi massacrada. A maioria das fontes indica que o cerco durou cerca de três semanas, com a conquista dos sassânidas entre 15 e 20 de maio.
Os sassânidas persas, sob o comando do general Charbaraz, se juntaram a Neemias ben Hushiel e ao rico líder judeu Benjamim de Tiberíades, que havia reunido uma força de 26.000 judeus tiberianos. Neemias foi então nomeado governante de Jerusalém. Ele começou a fazer arranjos para a construção do Terceiro Templo.
As contas variam de acordo com o número de cristãos massacrados depois que a cidade foi tomada (entre 17.000 e 90.000). Seus corpos foram jogados em várias grandes valas comuns, incluindo a piscina Mamilla a oeste das muralhas da cidade (descobertas em 1989, escavadas em 1992 com milhares de restos humanos, 72% deles de mulheres). Este local de carnificina tornou-se subseqüentemente o lugar de enterro muçulmano mais reputado na Palestina, o cemitério Maman Allah (Mamilla). O patriarca Zacaria, e outros 35.000, foram feitos escravos.
Muitas igrejas na cidade (incluindo a Igreja da Ressurreição ou Santo Sepulcro) foram queimadas, e numerosas relíquias, incluindo a Verdadeira Cruz (Vera Cruz), a Lança Sagrada e a Esponja Santa, foram levadas para a capital de Sassanid, Ctesiphonte. A captura de Jerusalém pelos sassânidas, na primavera de 614, foi um tremendo choque para o mundo cristão, e o impacto psicológico de sua conquista talvez só possa ser comparado ao saque de Roma em 410.
A queda de Jerusalém e o roubo das relíquias serviram de grito de batalha do novo imperador bizantino, Heráclio, que organizou um contra-ataque. Jerusalém voltaria ao controle bizantino em 629.
Os bizantinos decidiram então atacar o coração da Pérsia, e, após seis anos de vitórias, obrigaram o imperador sassânida Cosroes a fugir da sua capital Ctsefonte para as montanhas. O exército sassânida derrubou Cosroes, elevando o seu filho Casades II ao trono. Cavades imediatamente enviou ofertas de paz. Heráclio não impôs termos severos, sabendo que seu império estava também próximo da exaustão. Como termos, os bizantinos readquiriram todos os territórios perdidos, seus soldados capturados, uma indenização de guerra, e o mais importante, a Vera Cruz e outras relíquias perdidas em Jerusalém em 614.
Após alguns meses de viagem, um triunfante Heráclio entrou em Constantinopla levando as relíquias sagradas para a Catedral de Santa Sofia, em 14 de setembro de 629. Muitos viram isso como um sinal de uma nova era de ouro que estava prestes a começar no Império Bizantino.
Infelizmente, isso não se concretizou. O império bizantino estava totalmente debilitado economicamente com a longa guerra e precisaria de vários anos para se reerguer. Mas, apenas dois anos depois de toda a festa em Constantinopla, a província da Síria seria invadida pelos muçulmanos.
Uma ironia da história é que, com a vitória, Heráclio se tornou um dos generais mais bem sucedidos da história, pelos seis anos de vitórias ininterruptas, por liderar o exército romano por onde nunca tinha ido antes, e por ter recuperado a Vera Cruz e outras relíquias. Contudo, Heráclio teria o seu nome manchado pelas derrotas contra os jihadistas árabes muçulmanos.
Quanto a Pérsia, ela também não teve tempo de se reerguer, sendo completamente aniquilada pela jihad islâmica. A Pérsia nunca conseguiu reencontrar sua grandeza desde que a praga islâmica se instalou nela. E o zoroastrianismo, uma religião monoteísta que precede ao Islã por pelo menos 18 séculos, seria praticamente exterminada da face da Terra.
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