Uma revisão do livro Christian Martyrs under Islam: Religious Violence and the Making of the Muslim World, Christian C. Sahner, Princeton University Press, 2018.
A pesquisa histórica da ascensão da civilização islâmica após a conquista rápida e inesperada da parte oriental do Império Romano (bizantino) e do Império Sassânida pelos muçulmanos, que foi concluída em menos de três décadas (634 dC-661 dC), tomou um novo rumo, à partir do final do século XIX, devido à profunda percepção de Ignaz Goldziher de que o vasto detalhe dos manuscritos muçulmanos não garantia sua precisão, notadamente considerando que as fontes muçulmanas foram escritas duzentos anos após essas conquistas. Desde então, tem havido um esforço contínuo e criativo dos historiadores para juntar as peças da era primitiva do islamismo através de outras fontes além das fontes muçulmanas, dependendo principalmente de artefatos ou de registros contemporâneos não árabes. Um trabalho recente que exemplifica esse esforço é a famosa e controversa obra de Patricia Crone e Michael Cook, Hagarism, de 1977. Hagarism ampliou a lente histórica usando uma variedade de fontes contemporâneas cristãs, judaicas, samaritanas e outras em várias línguas, incluindo grego, siríaco, hebraico e armênio. Essa mudança metodológica não só afetou a pesquisa da sociedade islâmica, mas também focou o interesse de estudiosos na diversidade da sociedade recém-criada, composta por um número significativo de cristãos, judeus, zoroastrianos e outros, em que os conquistadores muçulmanos eram minoria no califado.
Sahner, professor associado de história islâmica na Universidade de Oxford, busca seguir esta linha metodológica para investigar a posição da maioria cristã nos territórios ocupados pelo islamismo na sua história inicial no período de dois séculos, entre 660 dC e 860 dC. Ele utiliza das hagiografias de cerca de 270 cristãos que perderam a vida devido à sua oposição ao islamismo neste período.
Ele conclui de sua pesquisa que a taxa de conversão de cristãos ao islamismo foi distintamente mais lenta e mais complicada do que as fontes escritas por muçulmanos sugerem. Sahner afirma que se o grande analista muçulmano al-Tabari fosse tudo que pudéssemos confiar para entender a forma da sociedade do Oriente Médio no período pós-conquista, chegaríamos à conclusão errônea de que quase todos neste mundo já haviam se convertido em 923 dC. No entanto, este não foi o caso. A conversão dos cristãos ao islamismo também não era inevitável; em vez disso, foi “um processo frágil, longo e contestado”.
Os 270 “mártires cristãos” tratados no livro se dividem em três categorias principais: cristãos que se converteram ao islamismo e depois voltaram ao cristianismo; muçulmanos que se converteram ao cristianismo; e cristãos acusados de caluniar o profeta islâmico Maomé. Ou seja, cristãos acusados de blasfêmia e muçulmanos conversos ao cristianismo (apóstatas). As autoridades omíadas e abássidas torturavam e executavam regularmente esses indivíduos de maneiras “terríveis e ferozes”, incluindo crucificação, amputação e, o método preferido, a morte pelo fogo.
Sahner também mostra que impostos pesados e assédio (Jizya e dimitude) por parte das autoridades muçulmanas fizeram com que os cristãos se voltassem para o islamismo mais rápido do que ovelhas correndo para a água.
Ele documenta fontes cristãs e muçulmanas confirmando que blasfemadores e apóstatas cristãos eram regularmente queimados vivos, a tal ponto que imolação e a cremação tornarem-se símbolos na hagiografia cristã. Curioso perceber que os cristãos de hoje ainda estão sendo queimados vivos, não apenas por terroristas islâmicos do Estado Islâmico, mas por outros muçulmanos praticantes, como os muçulmanos paquistaneses que queimaram vivos um cristão “blasfemador” e sua esposa grávida.
O livro sugere que as autoridades omíadas e abássidas perseguiram e mataram cristãos blasfemos e apóstatas porque o islamismo era então uma religião minoritária e não podia permitir desafios à sua legitimidade. Essa talvez seja uma fraqueza do livro, que descreve as atrocidades sem identificar que elas seguem dos ensinamentos e ações de Maomé, todas elas confirmadas pelo seu alter ego Alá. As minorias cristãs que ainda existem nas nações muçulmanas de hoje, são perseguidas e mortas do mesmo jeito.
O livro ajuda a elucidar o processo “pelo qual o Oriente Médio predominantemente cristão da antiguidade tardia tornou-se a região predominantemente islâmica de hoje”. A conversão dos cristãos ao islamismo não era inevitável; em vez disso, foi um processo frágil, longo e contestado.
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